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sábado, fevereiro 05, 2005
Posted
9:43 AM
by André Melo
Espetinho Horroroso
Um passageiro do fundo vai descer, opa, lugarzinho à vista. Objetivo: sentar no banco antes que alguém o faça. Princípio: uma pessoa e uma cadeira se unindo com auxílio da lei da gravidade. Obstáculos: um idoso perto da porta e uma gestante próxima do corredor.
Sem perder mais tempo, sigo em direção ao local em questão. Mais à frente, noto as pessoas abrindo espaço para a gestante, coisa que só consigo usando meu corpanzil. O senhor idoso também ganha trânsito livre mesmo sem mostrar a identidade. Droga, com solidariedade vira covardia. Depois de muitos "com licença" e pisões no pés, consigo chegar antes. Nessa hora ainda dei uma mancada simulando alguém que precisa sentar. Não quero parecer alguém sem escrúpulos que deixa mulher grávida e velhinho de pé. Me acomodo fazendo expressão de dor para completar o papel. Falando assim parece crueldade, mas logo logo o ônibus chega na Rui Barbosa e boa parte dos passageiros descem. Só faltam... oito pontos.
Tudo bem, sei que é uma atitude um tanto rude de minha parte, porém, como a viagem é muito demorada, fazer o trajeto de pé fica quase desumano. Esse caminho na hora do almoço é ainda mais complicado. O ônibus fica lotado, o trânsito infernal e a fome pra piorar.
A viagem segue, ainda tenho tempo de pensar em outras coisas até que a entrada dos passegeiros é marcada por um cheiro diferente. Não me refiro ao odor dos ônibus ao meio-dia ou a fragrância do perfume de alguém, mas é de comida que estou falando. Rapidamente, sou surpreendido com uma passageira tirando da bolsa algo para comer, um espetinho de frango é o que parece.
Espetinho de frango, êta troçozinho asqueroso. Mais uma dessas iguarias de boteco da esquina. Frito sei lá quando, com um óleo perverso do tempo do "êpa". Isso sem falar da carne, que se bobear nem é frango, com tanto pombo por aí dando sopa. Definitivamente, um negócio que eu nunca encararia.
— Xii... olha lá - exclama um passageiro apontando para a janela.
Lá fora, um acidente parece bloquear a rua com carros da polícia de trânsito e ambulância. A viagem que já era demorada prometia prorrogação e pênaltis. Estou vendo que o almoço vai ter que esperar mais. O descontentamento tomava conta dos passageiros. Só não acabava com o ânimo de um deles, um não, uma. A mulher de pé à minha frente continuava saboreava o tal do espetinho horroroso. Tem gosto pra tudo nesse mundo.
A cena do trânsito interrompido persistia. Os guardas sinalizando o lugar, o motorista bolava rotas alternativas, o ônibus manobrando lentamente e os populares dando palpites. Dentro do coletivo, alguns passageiros reclamavam como de costume, outros desceram preferindo seguir a pé. Eu não tinha opção, ainda estava longe de casa e da cozinha. Passei, então, a distrair a mente pensando na morte da bezerra evitando ao máximo os outdoors com propagandas de comida, que parecem se multiplicar nessas horas.
Por fim conseguimos driblar o tumulto e com ônibus bem mais vazio continuamos o itinerário. A viagem ainda ia durar um bom tanto, a fome, ao que parece, também. Com o ônibus vazio, me senti à vontade para levantar a camiseta expondo a barriga que não parava de reclamar. Lembrei daqueles milhões de toneladas de alimento para as vítimas do tsunami, sendo que há fome bem aqui, dentro do Centenário/Campo Comprido. Esse mundo é injusto mesmo.
O ônibus ia chegar no terminal quando notei a mulher do espetinho de frango se levantado para ir embora. Ela tinha comido quase tudo, faltando só o finalzinho perto da base do palito. Ainda dava pra ver um bom talho de carne, que parecia bem frita. Por fora, uma casquinha espessa marcava presença, mostrando que o petisco estava bem torradinha, daquelas que quando a gente morde...
— O senhor quer me dizer algo? - a moça perguntou estranhando meu olhar insistente.
A julgar pelo cheiro, também devia estar bem temperadinho. Talvez com um leve sabor apimentado ou talvez com um sabor mais para vinagrete...
— Você está servido? - perguntou oferecendo o espetinho.
Só então despertei da hipnose com os olhos vidrados e a boca aberta para o salgado. Aceitar o restinho de um espetinho do boteco da esquina, oferecido dentro do ônibus por uma pessoa que nem conheço?
— Obrigado! - agradeci sorrindo.
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terça-feira, janeiro 25, 2005
Posted
5:51 PM
by André Melo
"Ornitorrinco, eu?"
— É, ornitorrinco. Você é um ornitorrinco?
Com uma pergunta dessas, eu me calei. A pessoa continuou.
— Pode falar, não tem problema. Você é um ornitorrinco, né?
— Bem... é... não!
A pessoa estranhou, ficou me olhando mais um tempo, não pareceu se convencer. Por fim encerrou o assunto.
A viagem de elevador durou mais alguns instantes, mas logo estávamos todos na portaria. Eu ainda estava tentando entender, pensei até em perguntar para a moça, mas quando me virei ela já tinha ido. Procurei um espelho para tentar achar algo estranho, mas eram apenas as vestimentas de sempre: jeans batido, camiseta surrada, tênis velho. Poxa vida, preciso compras umas roupas...
— O senhor me desculpe, mas não permitimos entrada de animais na loja - o vendedor foi barrando minha entrada.
— Sim, mas eu não estou com...
— Isso inclui ornitorrincos.
— Como disse?
— O senhor vai ter que sair porque não permitimos ornitorrincos no interior da loja.
De novo esse papo? Sem entender, ainda olhei pro interior da loja para ver se era uma brincadeira ou algo parecido. De relance ainda vi uma criança apontando para mim e dizendo: "Olha lá, mãe, um ornitorrinco!".
— Se o senhor não sair agora, vou ser obrigado a chamar a segurança. Ou o zoológico!
Saí de lá com um misto de revolta e confusão. Será que o mundo todo tinha se transformado numa grande pegadinha? Voltei para casa a passos largos, fugindo das calçadas movimentadas. Quando cheguei, tratei de logo apanhar a Barsa, uma enciclopédia resquício da época do colégio. Lá havia a figura de um ornitorrinco, juntamente com uma breve explicação. O ornitorrinco, segundo dizia, era um animal com pêlos e pico de pato, considerado uma forma de transição entre répteis e mamíferos. Tudo bem que eu não sou nenhum Brad Pitt, mas não tinha nada a ver comigo. Além do mais, ele vive na Austrália, não no Bigorrilho!
Peguei de volta o elevador com a certeza de saber a verdade. Quando cheguei, logo vi que os boatos circulam rápido pelos corredores do meu prédio, uma comitiva de curiosos me esperavam. Todos queriam ver o ornitorrinco do prédio.
— Olha só: é ele! - berraram apontando pra mim.
Na portaria foi aquele alvoroço, gritos de todos tipos se sucederam, "Um ornitorrinco de verdade!", "Que ornitorinco feio!", "Criatura nojenta!", "Chamem a carrocinha!".
Agora que sabia de toda verdade, podia me defender e desfazer o engano.
— Vocês só podem estar enganados. Eu não sou um ornitorrinco, entenderam? Não sou um ornitorrinco!
Por um instante eles pareceram convencidos, porém um voz na multidão gritou:
— Ele está dizendo que não é um ornitorrinco, isso é justamente o que os ornitorrincos fazem quando são descobertos!
O caos voltou, "É mesmo, ele é um ornitorrinco!", "E um ornitorrinco dos feios, diga-se de passagem!", "Uma criatura nojenta!", "Chamem a carrocinha!".
— Vocês só podem estar enganados. Está tudo explicado aqui na Barsa, os ornitorrincos tem bico de pato e eu não tenho bico de pato. Eles também são recobertos por pêlos e eu não tenho pêlos. E pra fechar, o ornitorrinco vive na Austrália. Eu não vivo na Austrália, sou daqui!
Os argumentos parecerem convencer os populares e aos poucos a conversa mudou de tom. "Viram só? Ele é diferente dos ornitorrincos", "Se não tem bico de pato ele não pode ser um", "Não se esqueça que também não tem pêlos".
De repente a discussão foi interrompida por um grito desesperado:
— Que coisa mais horrível, um ornitorrinco sem bico e sem pêlos! Por favor, chamem a carrocinha!!
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terça-feira, janeiro 18, 2005
Posted
4:04 PM
by André Melo
A monótona rotina do laboratório
O tempo não passa e eu louco para ir embora, não agüento mais ficar aqui. Mês de janeiro, o verão fervendo nas praias, sol, mar e eu aqui dentro desse laboratório. Por mim eu saia agorinha, deixava os animais e me mandava. Tem bastante comida, eles iam se virar bem, eu é que ia dar no pé.
— Sabe onde é que está o éter?
— Éter? Na estante aí de baixo.
Ficar olhando essa bicharada, basicamente é isso que eu faço. Fico de tocaia, vendo quando acordam, o que estão aprontando, pra onde estão indo. Não é lá uma tarefa muito difícil, mas tem que ter muita paciência. Quando eu cheguei aqui não conhecia direito esses bichos, foi uma tremenda descoberta. Tudo que eles faziam era novidade, levou um bom tempo para me acostumar. Conseguir distingui-los foi outro desafio, porque olhando assim eles são todos iguais. Tive que aprender a reparar nos pequenos detalhes de cada um, os olhos, as orelhas...
Depois da fase de descoberta é que as coisas começam a ficar monótonas. Tudo que a gente tem que aprender sobre eles a gente já aprendeu. Eles também já se acostumaram com a gente. Antes dava pra sentir que ficavam morrendo de medo, se tremiam todos, agora conseguem até relaxar.
— Não está aqui não. A estante tá vazia.
— Xii... será então que acabou?
— Não tem mais éter?
Se antes eu me divertia no laboratório, agora não passava de uma rotina. Todo santo dia, eles fazem a mesma coisa e eu sempre de vigia. Antigamente achava que o trabalho nos laboratórios era emocionante, igual nos filmes americanos. Aquilo, sim, que é um trabalho legal, onde os cientistas fazem poções coloridas, saindo fumaça e sempre descobrem alguma coisa importante. Isso quando não acontece algum acidente de proporções catrastróficas. Por outro lado, aqui nesse laboratório quando quebram alguma coisa a única coisa que se vê é estagiário levando bronca, não tem a menor graça. Droga, se ao menos açoitassem um pouco mais...
— Espera - buscou um vidro na prateleira. — Tem esse daqui, mas tem só um restinho. Você vai precisar de muito?
— Não, é só para sacrificar o camundongo.
— Ahn tá, então esse daqui serve.
Divertimento, taí uma coisa que nunca vou ter por aqui. No começo eles ainda brincavam comigo, a gente se divertia um bocado. Davam uns pedaço de papel que eu estraçalhava em dois tempos. Eles gostavam de ver e me davam mais coisas. O problema foi quando mordi o dedo de um deles, desde então acabaram-se as brincadeiras.
— Tome aqui um pedaço de algodão pra passar o éter. Só que faça isso dentro de uma cuba, senão aqui vai ficar cheirando isso um tempão.
— Não se preocupe, eu sei o que fazer.
Agora que não tem mais brincadeiras, vivo tentando fugir. Outro dia mesmo fiquei o dia inteiro roendo a grade, mas não adiantou nada. E pensar que ainda me chamam de "roedor".
Olha só, foi só falar que um deles resolveu aparecer, carregando um chumaço de algodão. Ele agora está molhando o algodão com alguma coisa. Será que é de comer? Não sei, mas eu acho que daqui a pouco ele vai jogar isso aqui dentro. Tomara!
— Ó, não esqueça de depois jogá-lo no saco de lixo biológico. Outro dia você esqueceu e eu que tive que limpar.
— Eu estava apurado e acabei me esquecendo, desculpe. Hoje eu só tenho esse para sacrificar, pode deixar que quando terminar eu limpo tudo por aqui.
— Vai tirar o cérebro?
— É, desse aqui eu tiro o cérebro. Só não sei se o experimento vai dar certo com ele.
— Por quê?
— Não sei. De todos esse aqui era o mais burrinho, coitado...
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terça-feira, janeiro 11, 2005
Posted
6:10 AM
by André Melo
Paixão cor-de-rosa
Ela estava saindo de uma loja, isso eu me recordo bem. Estávamos perto de uma dessas datas importantes e o shopping estava explodindo de gente. Até hoje não entendo como pude reparar nela em meio aos corredores lotados daquele lugar. Mesmo assim, lembro que até deixei as sacolas se esparramarem de tão surpreso que fiquei. Tudo por causo dela: a menina do vestido cor-de-rosa.
Até então aquele tinha sido mais um dia de compras para um homem: chato e triste. Chato por ter que canelar atrás dos melhores preços. Triste quando a gente percebe que mesmo os melhores não são tão melhores assim. A monotonia estava instaurada até o momento que bati os olhos naquela moça de vestido cor-de-rosa. Ela estava saindo da loja com a pressa habitual de fim de ano. Imediatamente segui atrás dela, eu tinha que ficar por perto de qualquer jeito.
Por onde ela ia eu ia atrás, a tática era essa. Não me perguntem por que eu estava fazendo aquilo, só estava seguindo os instintos. Nós, homens, fazemos isso com freqüência, sabe, pelo menos quando corremos atrás de mulheres e bolas de futebol. Os mesmos instintos que me faziam detestar as compras de fim de ano agora me faziam perseguir a tal mulher do vestido cor-de-rosa. Era difícil entender e só continuando essa busca frenética eu poderia saber o porquê.
Após caminhar por uma dezena de vitrines e lojas, a menina do vestido cor-de-rosa resolveu se sentar para descansar. Foi só então que pude observar com calma a donzela que atraía minha atenção. Para não dar bandeira, me coloquei num ponto meio distante onde não levantaria maiores suspeitas. Foi então que as análises masculinas começaram.
Estava calor aquele dia e o shopping abarrotado tornava as coisas ainda mais escaldantes. Por todos os lado as pessoas se abanavam, o que dava pistas de que o ar-condicionado não estava funcionando direito. A menina em questão se refrescava com um sorvete, numa cena de dar água na boca. O vestido cor-de-rosa estava grudado no corpo, destacando sua silhueta bem desenhada. Eu precisava falar com ela.
— Posso me sentar aqui? - uma mulher interrompe meu devaneio.
— Claro... eu... eu só vou tirar essas sacolas daqui.
Me organizo com os embrulhos e quando retomo minha vigília noto que a moça do vestido cor-de-rosa não está mais lá. Ainda procurei pelos quatro cantos, porém sem conseguir avistar minha musa. Rapidamente recolho os embrulhos e saio em sua busca. Chego onde ela estava sentanda, mas nada indica aonde ela possa estar. Coço a cabeça sem idéias até que a luz refletida do vestido cor-de-rosa me dá sua localização. Ela estava indo para o segundo piso e é para lá que eu vou!
As coisas em cima não estavam muito melhor, uma multidão de pessoas ainda me separava da menina do vestido cor-de-rosa. Apesar disso, ainda conseguia identificá-la pelo andar apressando e o tecido esvoaçante. Apertei o passo para por fim a essa angústia e falar com ela, saber pelo menos o nome.
— Com licença, eu preciso falar com você! - a surpreendi num dos corredores depois de uma corrida.
— O quê?
— Eu preciso falar com você!
— Com licença, estou com pressa...
— Prometo que vai ser rápido. Eu só gostaria de saber uma coisinha, pelo menos o nome!
— Meu nome? - começou a ajeitar o cabelo toda vaidosa. — Eu me chamo Camila.
— Tá, mas eu não quero saber o seu nome.
— hã??
— Queria saber o nome da loja onde você comprou esse vestido MA-RA-VI-LHO-SO! Adorei esse corte justinho, amei esse tecido esvoaçante e achei essa cor um arraso! Ele é simplesmente tudo de bom!!
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terça-feira, janeiro 04, 2005
Posted
9:56 AM
by André Melo
Avestrusiness
— Dinheiro, muito dinheiro.
— Oi? - pergunto para saber se a conversa é comigo.
— Estou falando de dinheiro e dinheiro de verdade!
Interrompo a leitura do jornal para tentar identificar aquela voz. Quando olho, dou de cara com Clédisson Craveira com um sorriso de orelha à orelha.
— Tenho uma coisa muito importante para lhe contar - disse se inclinando para cochichar. - Eu vou ficar rico!
— Comé que é?
— Vou ficar rico!
— Você vai o quê?
— Ri-co!
Espere um pouco. Por um instante cheguei a ficar surpreso, achando que podia ser verdade, mas logo depois recobrei a razão. Antes de tirar qualquer conclusão achei melhor deixar Clédisson Craveira terminar a história.
— Estou prestes a entrar de sócio em uma jogada quente, um verdadeiro negócio da China! Capital com retorno garantido!
Agora estou entendendo, mais uma vez o Clédisson Craveira tinha um plano infalível para enriquecer do dia pra noite. Não era a primeira vez que ele surgia com uma dessas "jogadas quentes", "negócios da China". Só espero que agora não acabe mal como daquela vez em que cismou de vender empadão com recheio de celular na porta de penitenciárias.
— Sei que cê tá querendo saber qual o empreendimento com capital de retorno garantido, não é? Pra você eu até conto porque sei que é de confiança - me entregou uma pasta de couro preta com letras douradas onde se lia "Agrobusiness".
"Uau!", pensei comigo mesmo, pelo jeito a coisa era séria pra valer. Não parecia nada de delito, criminoso, nem ao menos contraventor. Quando abri a pasta finalmente eu comecei a entender o que se passava. Em letras garafais, o título tinha os seguintes dizeres: "Como criar avestruz?".
— Criar avestruz? Você está pensando em criar avestruz?
— É o negócio do momento!
— Poxa vida... - disse nitidamente impressionado pelo conteúdo da pasta, repleto de plantas e esquemas. - Vejo que a coisa é pra valer...
— "Um negócio tão seguro que tem até seguro!"
Nessa hora me lembrei do comercial que passa na TV, aquele em que o Beto Carreira fala das maravilhas em se criar avestruz. Só pode ser daí onde o Clédisson tirou essa idéia estranha.
— Criar avestruz, hein? Nunca pensei que você fosse fazer isso, Clédisson. Nem sabia dessa ligação com o campo...
— Campo, eu? Não, não vou precisar disso. Pretendo começar a criação aqui mesmo, em casa. Só depois que o dinheiro começar a entrar é que vou expandir o negócio. Tudo questão de tempo, é verdade.
— Peraí, criar avestruz em casa? Mas você mora em apartamento!
— Calma, já está tudo planejado. Já demarquei certinho o espaço onde vou colocar os bichinhos.
— "Bichinhos"? Você já viu o tamanho deles? Um avestruz deve ter pelo menos uns 2 metros!
— Fique calmo, fique calmo. O teto lá de casa tem uns 2 metros e meio...
— Você só pode estar louco... Mas me diga uma coisa, depois você vai abatê-los assim, dentro de casa?
— Abater? Você diz matar os bichos?
— Sim, ué? Abater os avestruzes, para tirar a carne...
— Você não está entendendo, eu vou criar os avestruzes, não tem nada de matar ninguém.
— Sim, mas as pessoas criam para depois tirar a carne.
— Não fale bobagens, onde já se viu comer carne de avestruz?
— Qual o problema? A carne de avestruz é uma iguaria fina hoje em dia.
— Carne de avestruz...
— Você não acredito, né? Então o que você vai fazer com os avestruz depois?
— Depois? A gente vende... sei lá, vende pros circos, pet shop... vende pra polícia! Os avestruz são treinados para farejar tóxico!!
— Avestruz farejadores - repeti prendendo a gargalhada.
— Me dá isso aqui - disse tomando a pasta. - Já vi que cê não entende nada de avestrusiness...
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